quinta-feira, 23 de julho de 2009

Multiplicação de Mitocôndrias: Utilidade apenas no esporte?

O músculo esquelético é um tecido altamente maleável, capaz de consideráveis adaptações metabólicas e morfológicas em resposta a quantidades repetidas de atividades contráteis (exercícios). Adaptações induzidas por atividades contráteis nos músculos são altamente específicas, e dependem até do tipo de exercício (força ou resistência), como também da sua freqüência, intensidade e duração(1).

É bem estabelecido que a atividade contrátil crônica, em forma de quantidades repetidas de exercícios de força ou de longa duração, normalmente intercedido com períodos de recuperação, resulta em aumentos no conteúdo mitocondrial de todos os 3 tipos de fibras musculares (I, IIa e IIb)(2), em função da maior geração de uma variedade de produtos genéticos, indicando uma alteração do conteúdo muscular dessas mitocôndrias, causando uma maior resistência à fadiga(3-5). Isto pôde ser comprovado devido a capacidade aumentada das mitocôndrias oxidar substratos respiratórios, sejam isoladas(3,5), ou mergulhadas nas fibras musculares(4).

O aumento na densidade mitocondrial muscular e atividade enzimática é referenciada como “Biogênese Mitocondrial”. Estas modificações induzidas pelo exercício foram reportadas inicialmente há mais de 30 anos, contudo os padrões dos sinais iniciais de transdução e o processo de concentração de organelas durante a multiplicação das mitocôndrias começou a ser elucidado há menos de 10 anos. Este conhecimento tem relevância particular para o entendimento das doenças de base mitocondrial, como também, podem melhorar o nosso entendimento sobre os padrões mitocondriais envolvidos na morte celular programada (apoptose) e as alterações induzidas pelo envelhecimento(1).

Tem sido proposto atualmente, que o envelhecimento pode ser resultado de danos oxidativos irreversíveis para macro-moléculas, induzidos por um aumento nocivo da produção dos radicais livres do oxigênio (ROS) causado pela disfunção mitocondrial com a progressão da idade. Isso foi definido como “Teoria do radical livre do envelhecimento”, proposta por Harman (1956)(6), e recentemente vem ganhando suporte devido aos dados obtidos devido aos avanços tecnológicos na biologia do radical livre. Dentro do músculo esquelético envelhecido, há uma perda significante no número de fibras musculares “sarcopenia” e também evidentes anormalidades bioquímicas e morfológicas(7).

Outras evidências sugerem que essas alterações mitocôndriais induzidas pela idade poderiam ser parcialmente atribuídas à disfunção mitocondrial, pois as atividades das enzimas e as taxas de síntese protéica dentro da mitocôndria declinam com a idade(8,9). Alguns estudos demonstram ainda, que o acúmulo de disfunção mitocondrial relacionada a idade pode resultar em dano oxidativo progressivo induzido pelos ROS, produzindo um prejuízo adicional da capacidade oxidativa nos músculos dos idosos. Além disso, a disfunção mitocondrial tem sido também relacionada com a perda de massa muscular induzida pela idade conhecida como sarcopenia(10).

Em conclusão, a biogênese mitocondrial induzida pelo exercício crônico é reconhecida na literatura atualmente por apresentar várias utilidades que vão desde a recuperação de doenças crônicas e redução da sarcopenia até o aumento da performance nos exercícios, especialmente, os de longa duração. Desse modo, pode ser visto que a biogênese mitocondrial apresenta uma importância que vai além das implicações esportivas, podendo ser um importante aliado no aumento da qualidade, autonomia e até na espectativa de vida.

BIBLIOGRAFIA

1 - Adhihetty PJ; Irrcher I; Joseph AM; Ljubicic V; Hood DA. Plasticity of skeletal muscle mitochondria in response to contractile activity. Exp Physiol. 88(1):99-107, 2003.

2 - Baldwin KM; Klinkerfuss GH; Terjung RL; Mole PA; Holloszy JO. Respiratory capacity of white, red, and intermediatemuscle: adaptive response to exercise. Am J Physiol. 222, 373–378, 1972.

3 - Holloszy JO. Biochemical adaptations in muscle: Effects of exercise on mitochondrial oxygen uptake and respiratory enzyme activity in skeletal muscle. J Biol Chem. 242, 2278–2282, 1967.

4 - Walsh B; Tonkonogi M; Sahlin K. Effect of endurance training on oxidative and antioxidative function in human permeabilized muscle fibres. Pflügers Arch. 442, 420–425, 2001.

5 - Bizeau ME; Willis WT; Hazel JR. Differential responses to endurance training in subsarcolemmal and intermyofibrillar mitochondria. J Appl Physiol. 85, 1279–1284, 1998.

6 - Harman D. Aging: A theory based on free radical and radiation chemistry. J Gerontol. 11, 298–300, 1956.

7 - Evans W. Functional and metabolic consequences of sarcopenia. J Nutr. 127, (suppl.) 998S–1003S, 1997.

8 - Rooyackers OE; Adey DB; Ades PA; Nair KS. Effect of age on in vivo rates of mitochondrial protein synthesis in human skeletal muscle. Proc Natl Acad Sci U S A. 93, 15364–15369, 1996.

9 - Conley KE; Jubria SA; Esselman PC. Oxidative capacity and ageing in human muscle. J Physiol. 526, 203–210, 2000.

10 - Bua EA; McKiernan SH; Wanagat J; McKenzie D; Aiken JM. Mitochondrial abnormalities are more frequent in muscles undergoing sarcopenia. J Appl Physiol. 92, 2617–2624, 2002.